Instalação Pass_ar_os

DESCRIÇÃO DO PROJETO

A instalação Pass_ar_os é composta por 600 unidades de pássaros em 5 posições diferentes. A estrutura principal de cada peça é uma base feita em fibra de vidro e finalizada com resina acrílica, na qual 30 artistas fizeram intervenção artística com as mais variadas técnicas e estilos.

Cada unidade tem cerca de 20x20x5cm de dimensões e o peso de cada escultura varia entre 20 a 40 gramas.

Os materiais utilizados pelos artistas na intervenção são variados e é essa variedade e multiplicidade que nos interessa para mostrar que o indivíduo é preservado mesmo quando em grupo. Assim, a pluralidade de técnicas e materiais representam a poética do Artrilha e da instalação. São materiais como: pintura à óleo, pintura acrílica, aquarela, guache, assemblage, cordas, fios, linhas, arames, ferro, cerâmica, papel marchet, colagem, areia, material de modelagem, pedras, papel, bordado, entre outros.

MONTAGEM

Cada pássaro tem um laço no dorso para ficar pendurado preso por fios de nylon do tipo transparente. A expografia é um conceito aberto que se ajusta a cada espaço que recebe a instalação, mas sempre indica a forma de revoada.

POÉTICA

Durante a pandemia, ao deter o olhar pela janela, eu pude notar com mais detenção de observação o bando de periquitos que rodeia e se abriga nas árvores ao redor da minha casa, em dois períodos distintos do dia. Muito cedo, por volta das 6h da manhã, quando eles chegam e ruidosamente cantam e gorjeiam em unidade, provocando um som que ecoa pelas vizinhanças. No final da tarde, a mesma revoada volta, mais intensa, mais barulhenta, mais alegre, mais viva. Chamando a atenção, fazendo a gente parar para olhar, mostrando para toda a gente que eles estão ali em bando, em coro, em tempo, em grupo.       

Por causa deles, eu comecei a reparar que estou cercada de pássaros dentro de casa. São diversas esculturas e pinturas que eu adquiri ao longo dos anos e que são numerosas e são elas que dão alegria ao meu espaço, onde pinto e trabalho.

Até o nome do grupo passou a ter diferente conotação. O neologismo criado para significar a junção de arte e trilha, começaram a ganhar outra dimensão: ar + trilha. Uma trilha no ar que me mostrava, insistentemente, que meu olhar não devia se manter no chão, mas voar.

Paralelamente a isso, comecei a notar que vários integrantes do Artrilha estamos produzindo obras com o tema “pássaros” e daí para frente veio um insight muito grande de que esse era o “caminho”.

Durante uma de minhas visitas culturais a São Paulo, me chamou a atenção uma revoada de pássaros e, em seguida, estive num espaço cultural em que eu não via os pássaros, mas eu podia ouvi-los com nitidez. Olhei ao redor e imaginei a instalação, o bando de pássaros.

Por que um bando de pássaros? Porque isso é a alma do Artrilha. O grupo nasceu para agir em coletivo. Cada um de nós, em essência e na sua individualidade, mas que em conjunto vai mais longe, é mais assertivo, é uma família que se ajuda e se ampara, é onde encontramos forças para seguir, é a fonte na qual nos alimentamos para buscar o norte para o qual construiremos nossa trilha.

A importância disso? Mostrar mais uma vez para o público a importância da ação conjunta, de uma comunidade de artistas que acredita em si mesmo e também no colega, na ajuda mútua daqueles com mais caminhada aos que estão começando, na motivação e brilho nos olhos dos que iniciam a jornada agora e contagia aqueles cujo olhar já perde o brilho… Somos um bando, mas quando estamos separados, às vezes somos invisíveis, inseguros, e travados. Mas quando seguimos coletivamente, nossas asas se esticam para todos os horizontes, voamos mais alto e para mais longe, seguimos com mais segurança porque estamos juntos, e buscamos juntos esse destino. Buscando a travessia.

No grande Dicionário dos Símbolos de Jean Chevalier podemos compreender como a simbologia dos pássaros é importante para as várias civilizações que passaram na história da humanidade, sendo reverenciados como ligação entre céu e terra, humanidade e divindade, mas também como a representação do destino dos homens. É no dicionário que encontramos a ligação do pássaro com a travessia. É informado que no Corão está escrito “no pescoço de cada homem, atamos seu pássaro”, ou seja, cada um de nós tem o seu destino, a sua jornada e a sua travessia, e o pássaro contextualiza esse percurso.

Em “Grande Sertão: Veredas”, de Guimarães Rosa, está escrito: “O real não está no início nem no fim, ele se mostra pra gente é no meio da travessia”. É disso que se trata essa instalação, falar da nossa travessia nessa vida, e ela é linda, ela é colaborativa, ela é cheia de arte e de gente trabalhadora e guerreira, é formada por respeito e alma. Alma brasileira, alma de periquito, alma de gente que não se cansa de acreditar em um voo que são passos no ar.

Nós somos a própria travessia. Nós somos aqueles que buscam. E “quem elegeu a busca não pode recusar a travessia” (Guimarães Rosa em Grande Sertão: Veredas). Essa é a nossa travessia, não a recusamos, porque já estamos em pleno voo, criando passos no ar.